O Amor na Porta à Frente
Capítulo 16
Namoro Reatado
Evelyn andava às voltas na cama. Eram oito e meia, a claridade já lhe entrava pelos pequenos buracos do estore, e já não conseguia dormir mais. Aquele silêncio era ensurdecedor. Doug tinha cumprido a sua promessa e nem um ruído se fazia ouvir naquele prédio. Evelyn deu mais uma volta e suspirou, ficando de barriga para cima a mirar o tecto.
- Isto é impossível – reclamou, para si mesma.
Levantou-se e tomou um duche. Ao abrir o roupeiro, já com as todas as suas roupas arrumadas, pensou no que vestir. Optou por uma saia e uma blusa simples, e calçou uns botins pretos. Depois de beber uma caneca de leite e de se pentear e maquilhar, saiu de casa e começou a andar em direcção à clínica, apesar de o seu turno apenas começar ao meio-dia.
Quando lá chegou dirigiu-se a Phil, que pareceu surpreendido de a ver já lá.
- Então doutora, já de volta? – Perguntou ele, sempre com um sorriso no rosto – Ainda é bastante cedo.
- Eu sei, mas já não conseguia ficar mais tempo na cama. Então o que é que perdi, Phil?
- Ah, umas gripes, nada de especial. Mas diga-me lá… ouvi dizer que teve uma surpresa ao chegar.
Evelyn franziu as sobrancelhas. Como é que ele sabia?
- Como é que sabes?
O secretário riu.
- O Grayson veio cá durante as suas férias à sua procura, e eu disse-lhe que tinha ido passar essas semanas fora. Então ele perguntou o que é que eu achava de lhe encher a casa de rosas para quando regressasse. E então, gostou? Vai retomar o namoro com ele?
Então tinha sido assim que Grayson tinha sabido das suas súbitas semanas fora. Evelyn engoliu em seco e respondeu bem fundo.
- Phil, se chegar alguém podes mandar para o meu consultório – disse-lhe, evitando a pergunta que lhe fora feita.
Fechou-se no consultório e pousou a mala no pequeno sofá cinzento, vestindo a bata de branca de seguida. Depois sentou-se na sua cadeira e ligou o computador, soltando um suspiro. Abriu a gaveta da secretária e de lá tirou a moldura com a sua fotografia e de Grayson, e ficou a mirá-la por alguns momentos. Naquele tempo eles estavam genuinamente felizes, e ela deu por si a pensar sobre se deveria, ou não, voltar para ele. Sabia que, se o fizesse, tinha uma vida garantida. Sempre falaram de casar, de ter filhos, ia conseguir tudo o que quisesse. Mas será que o ia conseguir com a pessoa certa? A imagem de Doug, aquele homem tão picuinhas e detestável e irritante, apareceu-lhe de súbito na mente e ela forçou-se a encostá-la para um canto. “Mas ele é que não quis”, pensou, “eu estava disposta a dar uma oportunidade… ele é que se armou em parvo e…”, de novo, suspirou. Estava a ficar com uma dor de cabeça.
Não estava na altura de ser infantil e imatura e sentimental. Há dez anos que namorava com Grayson, não podia deitar tudo a perder por três míseras semanas com quem nem sequer se dava bem no início. Com a confusão que se passava na sua cabeça à parte, a decisão era bastante lógica até.
Levou a mão ao telefone que tinha na secretária e marcou o número do antigo namorado, esperando depois que ele atendesse.
- “Pensava que não me ias ligar” – atendeu ele, sorrindo.
- Não sabia o que dizer, quando ligasse. Ainda não sei.
- “Então porque ligaste, Evie?”
- Quero conversar. Pessoalmente. Podemos ir almoçar ao sítio do costume?
Grayson sorriu.
- “Claro”.
No resto do tempo Evelyn esteve numa pilha de nervos. Os seus colegas chegaram e foram-na cumprimentar, e depois separaram-se entre pacientes. Ela atendeu três, e então a hora do almoço chegou. Despiu a bata, olhou-se ao espelho, respirou fundo e saiu. Começou a caminhar com pressa para não chegar tarde, e ao fazer a curva viu-o parado em frente ao restaurante, a ver as horas. Estava ainda mais bonito do que ela se lembrava, com o cabelo castanho-claro mais brilhante e o fato azul-escuro bem passado. Foi até ele e tocou-lhe no braço para que se voltasse. Ambos sorriram.
- Obrigado por teres vindo – agradeceu ela.
- O prazer foi todo meu. Entramos?
- Sim.
Entraram e pediram o habitual, o empregado já os conhecia. O ambiente estava um pouco constrangedor, e a médica não parava de enrolar discretamente o guardanapo enquanto mirava cada canto daquele sítio.
- Ainda não te agradeci pelas rosas. Eram lindas.
Grayson sorriu, mas então a sua expressão tornou-se mais pensativa e pesarosa.
- Ouve, eu sei que não tenho o direito de perguntar isto, mas estiveste com alguém…?
- Sim – ela respondeu-lhe sem que ele sequer tivesse terminado – Tu?
- Sim. Mas foi completamente vazio, sem sentido. Tenho a certeza que também sentiste o mesmo. É porque nós pertencemos juntos, Evie, consigo perceber isso agora. Eu amo-te, e estou tão arrependido.
Evelyn engoliu em seco. O que ela tinha sentido com Doug fora completamente o oposto de “vazio” e “sem sentido”, mas a partir do momento em que ele a descartara nada disso mais importava. Há poucos minutos tinha tomado uma decisão e ia mantê-la.
- Então queres retomar o namoro – constatou.
- Sim. Podemos ir com calma, com passinhos pequenos e…
- Está bem – Grayson olhou-a surpreendido, não esperava que cedesse tão depressa.
- Tens a certeza?
- Absoluta!
∴
Evelyn começou a subir o primeiro lanço de escadas quando ouviu passos a descê-las. Doug apareceu-lhe à frente, e ambos ficaram rígidos. Ele sorriu-lhe e passou-lhe ao lado, descendo mais algumas escadas.
- Doug! – Chamou ela, sem conseguir resistir – Então, cumpriste a tua promessa.
- Cumpro sempre, boneca.
- Onde é que ensaias agora?
- Na cave do Wren.
Ela assentiu, sorriu e subiu duas escadas.
- Evie – chamou ele, fazendo-a voltar-se na expectativa – Aceitaste? Voltaste para ele?
- Era a minha única opção, não era? – Perguntou-lhe, na esperança que ele negasse.
Porém ele apenas engoliu em seco e encolheu os ombros. Começou a descer o resto das escadas e ela começou a subi-las, tomando ambos de novo caminhos opostos.
Não me matem, não me matem, não me matem