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O Véu entre Mundos

por Andrusca ღ, em 30.08.11

Capítulo 3 (parte 1)

A Ajudante

 

Rick contou uma história ao seu parceiro, e depois disso deixaram-me em casa. Bem, à porta.

- Bolas, essa casa é assustadora – ouvi, ao meu lado. Mas nem olhei, já ouvia esta voz há tempo suficiente para saber quem é.

- Estou tão aliviada que estejas aqui, não gostava nada de fazer isto sozinha – desabafei.

- Bem… isto dá-me arrepios – agora sim, olhei para Frank mesmo a tempo de o ver desaparecer.

- Não me deixes sozinha! – Reclamei, bufando em seguida. Tenho que dizer, para um fantasma, Frank é um tipo bastante medroso. Quer dizer, a sério, a maior parte das coisas nem o pode atingir, e ele foge delas.

Respirei fundo e abri a porta, vendo-me de novo em frente ao hall. Bem, não podia ter medo desta casa para sempre, certo?

Entrei para dentro e fechei a porta atrás de mim, deixando a pouca luz do pôr-do-sol entrar pelo pedaço de vidro que havia por cima dela. Fui até ao interruptor e liguei-o, mas a luz piscou e voltou a desligar-se. Problemas eléctricos, ou fantasmas. A verdadeira pergunta é qual deles vou encontrar primeiro.

Suspirei e agarrei nas minhas duas malas, que estavam no chão, e comecei a subir as escadas para o primeiro andar. O corredor que se estendia à minha frente ainda parecia mais assustador que o hall, e as luzes começaram a piscar do nada. Ao longe, vi um homem aproximar-se depressa de mim, arrastava uma perna e tinha perdido um olho, e depois desapareceu tão depressa como tinha aparecido. Ouvi correntes e gemidos, e engoli em seco. “Tudo bem, não te passes, vais sobreviver”, tentei incentivar-me, mas foi escusado. Tomei mais uma grande golfada de ar e andei pelo corredor até chegar ao antigo quarto da minha mãe, onde eu ia ficar. De facto, era o único que ainda era mobilado. Ao longo do tempo esta casa sofreu assaltos, e coisas do género. Nunca teve ninguém para a salvaguardar, por isso a maior parte das coisas de cá estão partidas.

Suspirei, porquê passar por tanto apenas para estar numa casa? “Porque estás mais perto de tudo”, respondeu-me logo a consciência. E é verdade, apesar de aterrorizante, estar cá faz-me sentir mais perto do meu irmão de Hugh, como se estar cá me fosse ajudar a encontrá-lo.

A porta rangeu ao abrir, e quando tentei acender a luz também não funcionou.

- Sai – ouvi, num tom prolongado de um gemido, enquanto vi uma cara meio distorcida mandar-se a mim mas evaporar-se pouco antes de me chegar a tocar. Assustei-me, mas não cheguei a gritar, apenas voltei a minha cara o mais depressa que consegui.

A minha casa foi o epicentro de uma catástrofe sobrenatural, por assim dizer, e por isso os fantasmas, espíritos, e etc., sentem-se atraídos por ela. Claro que o facto de ter ficado abandonada tanto tempo ajudou para que se instalassem aqui, e cada vez mais foi sendo conhecida como assombrada.

Honestamente, não sei o que me assusta mais. Saber que há provavelmente uns trinta fantasmas cá, ou as poucas recordações que ainda tenho deste sítio.

Pousei as malas em cima da cama, também coberta de plástico, levantando uma onda de pó, e aproximei-me de um móvel que tinha um espelho pendurado na parede, por cima. No móvel estava uma fotografia dela. Da minha mãe. Estava toda poeirenta e mal se conseguia distinguir a sua figura, mas era o suficiente para me lembrar dela. Soprei o pó da moldura e observei-a. Os seus cabelos castanhos avelã caiam-lhe sobre os ombros em forma de canudos, e tinha o sorriso mais bonito que alguma vez vira. Eu parecia-me com ela. Tinha os seus olhos verdes, e as mesmas feições. Apenas o cabelo saiu mais claro, mas de resto, se ela fosse mais nova, poderíamos ser confundidas por irmãs.

Comecei a ouvir um barulho estridente e bastante incomodador, que me fez olhar para o espelho. Lá, sem nada visível estar a escrever, estavam a ser traçadas letras. Não apenas escritas, mas gravadas. “Afasta-te! Sai da casa!”, dizia lá.

Escusado será dizer que não preguei olho na noite inteira.

Quando o dia finalmente chegou, abri as janelas para arejar a casa e comecei a dar uma vista de olhos. Queria ver o que era para deitar fora, e o que precisava de comprar. Os barulhos continuavam, mas tentei abstrair-me disso. Tomei o pequeno-almoço no café, e depois voltei para casa.

Quando chegou ao quarto dia, quem parecia morta era eu. Não dormia nada de jeito, os fantasmas teimavam em dar-me visões, sonhos esquisitos, ameaças. E eu já estava pela ponta dos cabelos.

- Gosto daquele – disse, para a mulher que trabalha na loja dos móveis, referindo-me a um sofá bege, de canto – É exactamente o que a minha casa precisa, moderno, bonito…

- Nesse caso, devia considerar aquela televisão LCD, combina na maravilha – palpitou ela. Bem, faz por merecer o trabalho, lá vender tenta ela. Olhei para o LCD, ela até tinha razão.

- Sabe que mais? Tem razão – afirmei – E o móvel em que está em cima também lá fica bem.

Ela sorriu-me, visivelmente agradada.

Talvez uma remodelação seja exactamente o que aquela casa precisa, certo? Talvez os fantasmas se fartem e se decidam de uma vez por todas a irem-se embora. Com sorte.

Tratei das combinações para as entregas dos móveis, e fui de táxi para o stand de automóveis. Precisava de um carro, urgentemente.

A maior parte das pessoas fica chocada quando me observam nas compras. Bem, no meio de todo o azar na minha vida, tive um pouco de sorte. Descobri há poucos anos que os meus avós maternos tinham uma fortuna secreta, que deixaram à minha mãe, mas como ela morreu e o meu irmão desapareceu, eu enriqueci da noite para o dia. Às vezes acho que não compensa, mas é melhor que nada.

Depois de quase duas horas a ouvir o vendedor falar, finalmente consegui decidir-me sobre que carro comprar. Um mercedes preto, descapotável. Um carro de sonho.

Estava a tratar dos papéis quando o meu telemóvel começou a tocar. Não conheci o número, o que estranhei.

- Olá? – Atendi.

- “Nicole?” – Ouvi.

- Sim… quem fala?

- “É o Rick”.

- Oh… olá – mas o que é que ele quer? Só espero que agora, ao fim de quatro dias, não venha à procura de explicações, porque sinceramente já não sei que mais lhe dizer.

- “Ouve, não queria ser chato, mas… preciso da tua ajuda” – o quê?!

- Para quê?

- “Podemos falar pessoalmente? Há alguma sítio a que possa ir ter contigo?”

- Na minha casa? Mas… - comecei a pensar a que horas é que iria chegar – não apareças antes das seis, não vou lá estar.

- “Combinado. Até logo”.

- Está bem.

Está bem, isto foi estranho no mínimo. O que será que ele quer de mim afinal?

 

Este não está lá muito interessante, mas pronto...

Que acham que o Rick quer dela? (a)

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