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Together as One - The Second Part

por Andrusca ღ, em 09.05.11

Capítulo 23

Saudade

 

Danny

 

A imagem dela, deitada no chão apoiada nos meus braços, com uma poça se sangue a formar-se à sua volta não me abandonou nem um segundo depois desse momento ter acontecido. E muito menos aquilo que senti quando vi a vida fugir dos seus olhos, pouco antes de os fechar.

Nunca pensei que a fosse perder desta maneira. Até àquele momento, nunca pensei que a fosse perder de todo. Estávamos acabados, apenas isso. Foi uma estupidez, devia ter admitido logo que não lhe devia ter mentido, devia ter posto o orgulho de lado e dito que a amava acima de tudo. Nestas circunstâncias parece tudo uma enorme parvoíce.

E agora é tarde. Porque no momento em que parou de olhar para mim, no momento em que a senti parar de respirar, tudo o resto acabou. Naquele momento eu realmente percebi que estava tudo acabado. Mas ao contrário de antes, agora, eu não podia fazer nada para o evitar.

Eu e Michael tínhamos chegado lá o mais rápido possível, e quando Michael ficou para trás a telefonar para a polícia e eu entrei, e ouvi o tiro, senti que o meu mundo me tinha sido tirado.

 

*Flashback*

 

Abri a porta e corri até de onde tinha ouvido o barulho do tiro, apenas para ver a rapariga que amava cair no chão, e o filho da mãe que a feriu a olhar para mim.

- Ela sabia demais – disse ele, simplesmente. Nunca gostei deste gajo. Desde o primeiro dia em que o vi que soube que não nos íamos dar bem. E quando vi Ellie estendida no chão tudo o que me apeteceu foi matá-lo.

Mas não o fiz. Não o fiz pois ela precisava de mim neste momento.

- É melhor fugires meu filho da mãe, porque acredita que te vou apanhar – ameacei, vendo-o desatar a correr com um saco em seguida.

Corri até ela e agarrei-a. Ela estava débil, via-se à distância, e o sangue estava cada vez a escorrer mais. Sentia que ia começar a desfalecer só por ter o pensamento que a podia perder, mas tive que aguentar por ela. Mas ela não se aguentou por mim. Fechou os olhos antes que lhe pudesse dizer que a amava. Deixou-me antes de lhe declarar tudo o que sinto.

 

*Flashback*

 

- Tens que comer qualquer coisa Danny – insistiu Felícia, que se encontrava sentada ao meu lado, interrompendo-me os pensamentos.

- Não quero – disse-lhe, friamente, enquanto fixava ainda as minhas mãos com restos de sangue, apesar de já terem sido lavadas. O sangue dela. Senti de novo uma lágrima a escorrer-me pela face e Felícia apressou-se a abraçar-me. Ela perdeu tanto sangue… na altura em que a polícia e a ambulância chegaram já Ellie estava mais morta que viva.

- Tem calma, mano – pediu Michael, que estava sentado do meu outro lado, com uma voz completamente livre de sentimentos. Cada vez que Michael se sentia triste por alguma coisa, simplesmente se desligava completamente e não deixava que as emoções se mostrassem. Eu era assim também. Mas quando é ela que me faz ficar emocional, não consigo esconder.

Olhei em frente, o Sr. e a Sra. Davies estavam nas cadeiras em frente às nossas, também com expressões de enterro, e Kath estava com Alyssa sentada no chão, encostadas à parede. Rachel andava de um lado para o outro, impaciente, e Trent andava atrás dela a verificar que não fazia nada de estúpido.

Esta espera estava-nos a matar.

Ao fim de quase quatro horas de desespero, finalmente um médico saiu do bloco operatório e se dirigiu a nós.

- Estão da parte da Eleanor Davies? – Perguntou, com uma voz que ainda me pôs mais em baixo, pela tristeza que trazia.

- Sim – respondeu a Sra. Davies, levantando-se com o seu marido. Gesto que todos nós imitámos –, nós somos os pais.

- Eu lamento imenso – pronunciou o médico, fazendo com que mais uma lágrima me escorresse – Fomos capazes de estabilizar a hemorragia, porém até que ela acorde não seremos capazes de verificar os danos reais do disparo. E ela pode nunca conseguir acordar.

- O quê? – Perguntei, com a voz a fugir-me – Ela está em…

- Coma, sim – continuou o médico – Como eu disse, lamento imenso e…

Não ouvi mais nada. Não podia ser verdade, não assim. Agarrei no meu casaco e corri até à saída do hospital, onde me deixei cair encostado à parede, para deixar finalmente que toda a tristeza que me afundava saísse cá para fora.

“Ela pode nunca acordar… ela pode nunca acordar… ela pode nunca acordar…”. Não. Ela tem que acordar. Tem que voltar. Pode não ser motivo suficiente, mas tem que voltar para mim. Não posso viver sem ela. Não consigo.

Uma semana tinha-se passado desde que recebi a notícia de que o amor da minha vida podia não voltar para mim. Uma semana em que o hospital se tornara na minha casa. Eu não a podia deixar. Ela tinha que acordar. Ela ia acordar. E quando o fizesse, eu estaria aqui para a receber.

- Oi – disse Felícia, ao entrar no quarto depois de bater à porta.

Ellie estava num quarto particular, mas nem isso me deixava mais confortável. As flores que preenchiam este espaço não me distraíam do facto de que a rapariga com quem sonho está deitada cheia de fios à sua volta, e muito menos os cartões com desejos de melhoras.

- Já o apanharam? – Cada vez que alguém entrava no quarto, independentemente de quem fosse e do que me dissesse, esta era a pergunta que fazia.

- Não – disse Felícia, ao fechar a porta – Como é que ela está?

Nesta última semana faltei a todas as aulas, não queria afastar-me dela, e por isso vinha sempre cá alguém contar-me as novidades do dia. Felícia vinha quase todos os dias, ela tem sido o meu ponto de abrigo, ao fim e ao cabo.

- Como estava ontem – como eu desejo com todas as forças que não esteja amanhã.

- Toma – esticou-me um saco com um hambúrguer e uma Coca-Cola lá dentro, mas eu não o agarrei.

- Não tenho fome.

- Danny, ela não ia querer que morresses à fome enquanto esperavas que acordasse. Come, para estares bem quando ela acordar.

- Tu consegues ser uma seca… - tirei-lhe o saco da mão e comecei a desembrulhar o hambúrguer.

- Alguém tem que ser. Tenho que ir, tenho uma aula. Ligas se houver novidades?

- Ligo.

Deu-me um beijo na testa e saiu, deixando-me de novo sozinho com ela, fechando a porta atrás de si.

Mais dias passaram, fazia hoje treze dias desde que Ellie não acordava. Se antes estava a começar a desesperar, agora ainda estou pior. Alice trazia-me roupa lavada todos os dias, e se ao princípio os médicos não gostavam de me ter aqui dia e noite, agora já perceberam que é melhor nem se meterem, porque senão levam respostas tortas. Daqui ninguém me tira.

Os pais da Ellie vinham dia sim, dia não, mas não ficavam durante muito tempo. A Sra. Davies tem-se fartado de chorar, e não é a única. Cada vez que cá vêm, Kath, Rachel e Alyssa desmancham-se em prantos. Nessas vezes mordo-me todo para não me juntar a elas. Michael, que durante a primeira semana sempre se mostrou controlado à nossa frente, finalmente deitou umas lágrimas, agarrado à mão da irmã.

A verdade é que todos nós sentimos a sua falta.

Estava a escurecer de novo. Um outro dia tinha passado. Outro dia em que ela não me tinha mostrado aquele sorriso do qual tantas saudades tinha, outro dia no qual ela não tinha pronunciado o meu nome nem olhado para mim.

 Fui até à casa de banho do quarto e vesti umas calças do pijama e a t-shirt também dele. Voltei a sentar-me na cadeira ao lado da cama em que ela repousava tão em paz, e agarrei-lhe na mão. Ela estava fria. Não um frio mau, mas mesmo assim, mais fria que o habitual.

Parecia serena, quem não soubesse nem visse todos os fios que a rodeavam, diria que estava presa num sonho de fantasia numa terra qualquer. Não parecia estar a sofrer, e isso era bom. De certo modo amenizava a minha própria dor, porém não a dizimava nem de perto.

- Olá – murmurei, enquanto apertava a sua mão junto das minhas. Deixei que uma lágrima me escorresse pela face, tal como acontecia em todas as outras noites, quando começava a falar com ela – Apanharam-no finalmente, sabias? O inglês… - sorri debilmente ao lembrar-me da cara que ela me fazia cada vez que o chamava assim, e mais lágrimas escorreram – Ele estava a trabalhar com o pai dele, que aparentemente nem pai dele é. Já tinham feito isto em outros países… Ell, tens que me responder – implorei –, por favor não me deixes a falar assim para o ar, diz qualquer coisa. Ell… se ao menos soubesses quanto é que isto me está a custar… não suporto ver-te assim ligada a essas máquinas. Tens que respirar sozinha. Tens que acordar. Por favor, luta. Se por mim não chega, então luta por todos aqueles que também sofrem com isto. Luta pelo teu irmão, os teus pais, os nossos amigos. Não me deixes assim, imploro-te.

Mas nada aconteceu. Nos filmes sempre que alguém abre o coração assim a uma pessoa em coma, essa pessoa lentamente abre os olhos e uma música de fundo aparece, seguindo-se o final da história. Mas nós não estamos num filme. E por isso independentemente do que eu diga, ela vai apenas acordar quando estiver preparada para tal, por muito que me custe.

Suspirei e limpei as lágrimas. Levantei-me e aproximei-me mais dela, desviei-me o cabelo dos olhos e beijei-lhe a testa. Fazia-lhe isto todas as noites, na esperança que quando me desviasse ela teria os olhos abertos. Mas os dias passavam e isso não acontecia.

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