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O Véu entre Mundos

por Andrusca ღ, em 04.09.11

"Se esperássemos o tempo suficiente, poderíamos ver uma estrela cadente, aconteceu-me inúmeras vezes. Não sei em que é diferente de as observarmos do chão, mas parece que aqui em cima… não sei, é libertador. Parece que estamos mais perto daqueles pontinhos do que nunca. Como se por acaso nos esticássemos, os conseguiríamos de facto alcançar."

 

Capítulo 4 (parte 3)

Tia Emprestada

 

E depois há sempre aquela estrela. Seja qual for, há uma que brilha sempre mais que as outras, e que me faz sentir um brilho qualquer cá dentro. Que valho qualquer coisa. E assim sem mais nem menos, faz-me sorrir. É um espectáculo dos diabos, um dos mais bonitos que alguma vez vi em toda a minha vida.

- És oficialmente a tia fixe – disse Maggie, fazendo-me soltar uma gargalhada.

- Obrigada Maggie – agradeci.

- Mesmo a tia fixe – confirmou Jesse, vidrado nas estrelas que contemplava.

Eu tinha razão. Eles amaram. Tal como eu.

Ficámos por um bocado em cima do telhado, mas eventualmente tivemos que descer, porque amanhã ia ser dia de levantar cedo. Deitei-os aos dois no sofá cama, um ao lado do outro, e aconcheguei-os, mas quando ia subir para o meu quarto, aconteceu uma coisa que não esperava.

- Tens que nos contar uma história – disse Maggie, fazendo-me parar.

- Que história? – Perguntei, voltando a aproximar-me deles.

- A nossa mãe conta-nos sempre uma história antes de dormirmos – disse Jesse.

- Hum… - sentei-me na ponta do sofá cama e comecei a pensar. Sinceramente, o melhor é inventar, porque não me lembro de uma única história de crianças – Era uma vez, num reino mágico, uma linda princesa.

- Como se chamava? – Perguntou Jesse.

- Ela chamava-se… ela chamava-se Calíope. Ela era muito bonita, todos no reino a desejavam, mas era muito má. Era egoísta. E depois havia um príncipe que não era. Ele era também bonito, e educado, e também era uma boa pessoa.

- Como se chamava o príncipe? – Perguntou Maggie.

- O príncipe chamava-se… John.

- John? Isso é muito vulgar para um príncipe – disse Maggie.

- Tudo bem, John Maurice – eles riram-se, e eu também exprimi um pequeno sorriso – Um dia eles encontraram-se. E através de bons actos, o príncipe mostrou à princesa que fazer coisas em prol de outros sabia tão bem, ou melhor, do que as fazer para proveito próprio. Apaixonaram-se, e casaram-se. E viveram felizes para sempre.

- Tia fixe, és terrível a contar histórias – lamuriou-se Jesse.

- Eu sei querido, desculpa – pedi – Falta-me a prática.

- Porque é que não tens filhos? – Perguntou Maggie.

- Bem… ainda sou nova… e não encontrei ninguém com quem os quero ter, alguém que ame… - isso e tirando o facto de saber que se alguma vez tiver filhos, eles vão ter o dom. Vão ver fantasmas, tal como eu. Descobri que é hereditário, apenas não sei se era o meu pai, ou a minha mãe, quem o tinha.

- Mas queres filhos, certo? – Perguntou Jesse.

- Um dia, quem sabe – murmurei – Mas vá lá pessoal, são horas de dormir, amanhã têm escola.

- O tio Rick ainda não chegou – lamentou-se Maggie – Ele trabalha até muito tarde.

- Pois trabalha – concordei –, mas ele vai trazer as coisas para vocês usarem amanhã e para levarem para a escola, está bem? Eu espero por ele.

- Está bem – disse ela, enquanto eu a voltava a aconchegar dentro dos lençóis, juntamente com Jesse.

- Durmam bem.

- Fica connosco – pediu Maggie – A casa é menos assustadora contigo.

Sorri-lhe e assenti com a cabeça, sentando-me em seguida no cadeirão ao lado do sofá, onde eles estavam, e liguei apenas um candeeiro pequeno, ao meu lado, que dava pouca luz. Não passaram nem dez minutos e os miúdos já estavam a dormir, e eu sinceramente já estava cansada.

Fiquei a olhar pela janela durante algum tempo, à espera que Rick chegasse, e finalmente avistei um carro a estacionar e a desligar as luzes. Vi Rick a dirigir-se para a minha porta, e apressei-me a abri-la antes que batesse, para não acordarmos os miúdos. Ele tinha um ar cansado, mas o fato que sempre usava estava perfeito como sempre.

- Eles estão a dormir – informei, num tom baixo, fazendo sinal em seguida para que ele me seguisse até ao andar de cima, para não fazermos barulho. Ele nada disse, apenas me seguiu pelas escadas, e entrou no meu quarto como eu lhe tinha indicado. Bocejei, já era bastante tarde.

- Trouxe as coisas dos pirralhos – disse ele, passando-me duas mochilas para as mãos – Numa estão as coisas da escola, e na outra a roupa para amanhã. A Sheilla passa por cá de manhã para os levar.

- Está bem – disse-lhe.

- Como é que se portaram? – Perguntou ele, a fazer uma cara meio desconfiada. Eu sorri e sentei-me na cama.

- Bem, primeiro inundámos a minha casa de banho, e depois jantámos, e eu transformei a tua sobrinha numa pequena princesa. E observámos as estrelas – expliquei.

- Espera, a Maggie comeu? – Agora sim, estava mais desconfiado que antes. E surpreendido, também.

- Comeu. Comida chinesa. Não sei cozinhar – murmurei.

- A Maggie nunca come nada Nikki, isso é fantástico – encolhi os ombros e sorri.

- Eu consigo ser bastante persuasiva – gloriei-me – Além disso, sou a tia fixe.

- De qualquer maneira, há outra coisa que te quero dizer. Eu pedi para reabrirem o caso do teu irmão. – Disse ele, já com uma voz séria. Senti um aperto na barriga, agora estava a ficar nervosa.

- E? – Perguntei.

- Infelizmente recusaram – suspirei e dirigi o meu olhar para o chão, claro que tinham recusado, nem sei porque é que alguma vez pensei que fossem permitir – Mas… - olhei de novo para ele na expectativa. “Mas” era bom, certo? – Trouxe-te isto.

Rick aproximou-se de uma das malas dos miúdos que tinha trazido, que estavam agora no chão em frente à minha cama, e abriu-a, tirando de lá uma pasta.

- É…

- É a pasta do caso – interrompeu-me, mostrando-me um pequeno sorriso – Podemos combinar e começar a investigar um pouco.

- Rick! – Exclamei, enquanto num impulso me levantava e me abraçava a ele – Obrigada!